sexta-feira, 13 de setembro de 2013

A.(15) - A aposta do locutor



Futebol brasileiro perde brilho e corre para retomar a magia


Capítulo 1 - Seleção derrota o “complexo de vira-latas”

Amarelinha ( parte 15)



Feola entre os jogadores brasileiros
 

Resumo do texto anterior

Na partida de estreia da seleção brasileira da Copa da Suécia, em 1958, contra a Áustria, Garrincha ficou fora do time titular. Em seu lugar, entrou Joel, tricampeão carioca pelo Flamengo e tido como o mais inglês ponteiro brasileiro de sua época. Não driblava como Garricha, mas tinha uma finta curta, cruzamentos certeiros e marcava bem. E era isso o que a comissão técnica queria naquele momento: evitar que o time do Brasil tropeçasse no começo da competição e passasse a enfrentar o “complexo de vira-latas”, o que fazia o grupo tremer em horas importantes. O Brasil ganhou por 3 a 0.O primeiro passo já tinha sido dado. O próximo jogo seria contra a temível Inglaterra.



A aposta do locutor


Com a vitória de 3 a 0 contra a Áustria, a autoestima do torcedor brasileiro teve uma leve alta, embora o locutor Geraldo Bretas, da Radio Tupi, de São Paulo, continuasse a espinafrar a seleção brasileira e jurasse de pés juntos que largaria a profissão se o Brasil ganhasse a Copa de 1958, como prometera antes de a delegação do Brasil partir para a Europa. Aquela possibilidade, pelas estimativas do locutor, era impossível de acontecer. A primeira derrota, segundo Bretas, estava próxima, mais exatamente em Gotemburgo, Suécia, onde a seleção treinada por Vicente Feola iria agora enfrentar a temível Inglaterra.



Pelé: a espera para entrar no time


Como Bretas estava certo de que o Brasil tombaria no meio daquela sexta Copa do Mundo, Garrincha estava convicto de ter perdido o lugar naquele time depois de ser barrado por Joel na partida contra a Áustria. Com a vitória na largada da competição, seria besteira continuar a engraxar a chuteira para entrar no jogo. Pelo seu entendimento, Feola evitaria mexer na escalação para manter o embalo do time.

Garrincha até desanimou de chamar os companheiros do time pelos apelidos inventados por ele, motivo de divertimento do grupo desde os treinos no Brasil. Pelo relato de Ruy Castro sobre os apelidos, em Estrela Solitária – um brasileiro chamado Garrincha, assim, com a frustração de Mané, Bellini deixaria de ser o “Boi” ou “Marta Rocha”; Zito, o “Chulé”; Zagallo, o “Caspinha”; e Joel, seu rival, o “Fon-fon!”, referência ao fato de ser levemente fanho.

As conversas sobre a escalação na ponta-direita, porém, estavam longe de ser o inferno que Garrincha imaginava. Para Nílton Santos, por exemplo, Garrincha já deveria ter entrado no primeiro jogo. E mantê-lo na reserva, na opinião do lateral, seria ignorar um trunfo que ele, um jogador de 33 anos, jamais vira na vida.



Julinho e Garrincha

Feola tinha a mesma opinião. Não queria mais saber da cautela do jogo da estreia. Queria um time ofensivo, e esse time não poderia existir sem Garrincha. O próprio Joel sabia que corria risco sério de sair da equipe. O ponteiro desabafara com Zagallo, seu companheiro de quarto, às vésperas da partida contra a Inglaterra: “Preciso caprichar. Se o Mané entra no time, não sai nunca mais”.

Só quem pensava de forma diferente era Ernesto Santos, observador dos adversários da seleção brasileira contratado pela CBD. Santos tinha lugar cativo nas reuniões da comissão técnica que antecediam os jogos. Fizera então um relato no encontro com base nos jogos da Inglaterra nas eliminatórias. E os membros da delegação escancararam os olhos. Motivo: Slater, o lateral-esquerdo que poderia ser o responsável por marcar Garrincha.

Pelo relatório, o tal jogo limpo estava fora do dicionário do jogador inglês. De acordo com a terminologia do futebol brasileiro, Slater era um carniceiro do esporte. Mas era um carniceiro que escondia a faca e costumava terminar os jogos com abraços no árbitro e mensagens afetivas para sua família.


Gilmar

Nos jogos que havia assistido da Inglaterra, Ernesto Santos já vira o lateral-esquerdo quebrar um adversário. O esconder a faca implicava em pisar, com passos de elefante, no calcanhar do adversário durante a corrida, prender-lhe o pé e embolar-se com ele na hora do tombo. E o juiz entendia a cena como um abraço fraterno entre esportistas.

Cartão vermelho, caso existisse na época, seria pouco – roxo, talvez. Mas o juiz nem falta marcava. E a vítima ficava mancando pelo campo ou desaparecia no vestiário - e, é bom lembrar, não havia substituição. Final do jogo, Slater se mostrava um santo para o juiz, perguntava sobre o desempenho das crianças no colégio, sobre a saúde dos pais e elogiava sua honestidade em campo.

Na tal reunião a portas fechadas para decidir a formação do time, a forma de enfrentar o inglês tornou-se o centro da conversa. Carlos Nascimento argumentou a favor de Garricha. Fórmula: ele devia largar a bola logo de cara e nem chegar perto de Slater. Feola, Paulo Amaral e Hilton Gosling não entenderam muito bem a estratégia de Nascimento em que um inimaginável Garrincha aparecesse em campo  e vetaram Mané no jogo contra os ingleses.

A solução encontrada pelo grupo foi orientar Joel a buscar sempre a tabela com Didi e sair para a parte central do campo. Assim o lateral-esquerdo não teria o que fazer. No primeiro tempo da partida tudo saiu como o planejado. A retranca inglesa funcionou, mesmo com um Slater inoperante, e o ataque dormiu. 0 a 0.


Paulo Amaral

No segundo tempo a partida seguiu com uma torcida silenciosa. Até que Joel resolvesse experimentar uma jogada pela direita. Foi o momento de trabalho do lateral-esquerdo da Inglaterra: um pontapé na ousadia do atacante brasileiro. E a seleção voltou carrancuda ao vestiário com o empate de 0 a 0.

O jogo no domingo contra a União Soviética, a equipe do futebol científico, serviria para colocar em cheque a continuidade do sonho da equipe do Brasil em buscar o título e a qualidade do sono de Geraldo Bretas enquanto o plano de Machado de Carvalho permanecesse vivo em campos suecos.


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