Alex Ferguson, o vitorioso técnico do Machester United, estava nocauteado espiritualmente depois do jogo de seu time contra o Chelsea, no início de maio. E pôs a boca no trombone. Reclamou ao mundo que a expulsão de seu jogador fora resultado de uma encenação de um atleta adversário, um jogo sujo que ficaria eternamente entalado na garganta da comunidade esportiva do fair-play.
Ademais, a queixa não partia de um homem qualquer. Mas sim de um escocês que ganhara na Inglaterra um Sir antes do nome - insígnia que recebeu da rainha Elizabeth durante cerimônia no Palácio de Buckingham pelos serviços prestados ao futebol inglês -, passara 27 anos sendo técnico do time de Manchester, o que denotava uma fidelidade incapaz de se desgarrar sequer do pensamento, e tem uma estátua plantada ao lado do Old Trafford, estádio do Manchester United. Mais: em alguns dias iria se aposentar. E naquele momento, depois do incidente, Alex Ferguson era um homem indignado.
O motivo da revolta foi a atitude do zagueiro brasileiro David Luiz, que foi ao chão como se a morte tivesse chegado na esquina durante uma disputa de bola cheia de sopapos com Rafael, outro brasileiro, lateral direito do londrino Chelsea.
Mas a morte não chegou. E David Luiz foi flagrado pelas câmaras de tevê estatelado no gramado com um sorriso nos lábios, como se tivesse surrupiado uma azeitona de uma empadinha sem que ninguém percebesse. Pior: o juiz apresentou o cartão vermelho para o suposto agressor. Rafael se sentiu a própria empada.
Para quem disputava uma das últimas partidas como técnico, depois de quase três décadas defendendo a equipe do Manchester United - um recorde mais que invejável no universo do futebol -, ganhara 38 títulos e contribuíra para a felicidade de milhares de torcedores do time, Ferguson não poderia deixar de berrar. Ele não merecia aquele sorriso ao se aposentar aos 71 anos de vida.
David Luiz flagrado depois de disputa com Rafael |
As imagens de tevê mostraram o momento da expulsão com sinais de perversidade no sorriso do jogador do Chelsea. Mas como foi o desenrolar do lance e como teria se comportado a imaginação dos protagonistas?
O zero a zero mostrava o sono da partida, uma preguiça empurrada com os pés. O jogo não valia nada para o Manchester United, que já conquistara o campeonato inglês. Para o Chelsea valia um montão. A vitória faria o clube de Londres praticamente selar sua entrada na Copa dos Campeões da UEFA.
Mas nada acontecia. No finalzinho do jogo coube ao espanhol Mata acordar a torcida. Mata recebeu o passe do brasileiro Oscar e abriu o placar a três minutos do fim do tempo regulamentar. Naquele momento, eram três pontos para o time de Londres esbanjar cambalhotas na comemoração.
Em seguida, porém, veio o lance que foi a senha da revolta do técnico escocês. Rafael desceu para o ataque em busca do empate e deu de cara com David Luiz. Foi quando os dois atletas entraram em combate. Foi uma jogada bruta, em que os brasileiros se comportavam como se a bola fosse um prato de comida. E aí vieram cotoveladas, chutes, empurrões, e os dentes e unhas não se manifestaram por um fio.
Aconteceu então a queda de David Luiz. Tamanho entrevero poderia ter gerado vítimas, como testemunharam perto de 70 mil espectadores presentes ao Old Trafford, um gigante de cimento erguido quando Ferguson nem havia nascido.
Com o tombo, não veio o grito de dor, mas um sorriso que escapuliu dos lábios de David Luiz, um sorriso oculto para o arbitro, mas que as câmaras de tevê enxergaram muito bem.
Depois da luta na lateral, uma parte do campo em que jogadas notáveis normalmente não tinham vez, o zagueiro do Chelsea estava satisfeito por aquele quase nocaute que poderia render uma pena dura para o adversário. E escutou o apito, seguido pelo sorriso que chegou a todos os cantos pela tevê. Ferguson provavelmente viu o sorriso depois. Daí a fúria.
Se David Luiz não tivesse escancarado os dentes em sinal de alegria, Ferguson e a torcida do Manchester United teriam se conformado com o desfecho da pancadaria. E dormiriam sem pesadelos. Mas o sorriso mexeu com o orgulho do escocês e fez com que ele pusesse o trombone para fazer escândalo. O sorriso às vezes pode ser perigoso.
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